domingo, 31 de maio de 2009

Tartaruga Chinesa



Hoje é um bom dia para se agradecer.
Pela vida, pelo amanhecer, pelo entardecer, pelo anoitecer, pelo dormir e acordar na manhã seguinte, tudo é razão para se ter gratidão.
O que me fez refletir sobre isso foi a notícia que ouvi ontem a respeito da tartaruga mais velha do mundo que faleceu na China, nascida no século XVIII.
Isso mesmo. Essa anciã casca-dura, atravessou todo o século XVIII, o XIX, o XX e ainda viu cinco anos e três meses do século XXI.
Tá certo, tartarugas vivem muito mesmo, mas um quelônio, que passou sua vida inteira na água, vindo a terra apenas para desovar e voltar para a água (será que a água promove longevidade?) mostra o quanto esse ser foi realmente privilegiado.
Mas também precisamos levar em conta que as mesmas entraram num processo de ameaça de extinção no século passado.
Além do mais, esse país enfrentou invasões, conflitos internos, o Japão dominou-o, seu imperador foi destituído de seus poderes, o comunismo uniformizou-o, um estudante enfrentou sozinho um tanque, Mao-Tse-Tung abandonou a vida, a cultura renovou e pulou radicalmente de um pólo a outro, enfrentando os países capitalistas, ufa!Não é que a danadinha da velhinha resistiu a isso tudo?
Enquanto a ditosa senhora nadava, pescava, caminhava e procriava, caminheiros, cavaleiros, ciclistas em diversas épocas por ela passaram.
E o que a tartaruga tem a ver com isso tudo? Talvez não tenha nada a ver mesmo. Mas... e se fosse uma pessoa? Registraria tudo isso e muito mais. O cotidiano silencioso das donzelas que se espremiam em poderosos espartilhos para delinear suas cinturinhas de pilão, sendo que algumas delas chegaram a ponto de estraçalharem seus fígados, em busca da silhueta perfeita. E seus delicados pezinhos? Amarrados, bem apertadinhos para não crescerem demais, com a desculpa de que pés pequenos são delicados e bonitos em tamanquinhos, além de suas perninhas em vestimentas bem ajustadas para prenderem-se-lhes os movimentos e impedirem suas tentativas de fuga, sem esquecermos de mencionar aquelas covardemente assassinadas em tenra idade, muitas vezes por suas próprias mães que desejavam filhos homens, que produziriam riquezas para o país, para a família, e ainda guerreariam.
Quanto às inúteis mulheres sobreviventes, mesmo sendo exploradas em lavouras, carregando pesados fardos nos ombros, procriando guerreiros para a nação, servem para quê?
Mas era só uma tartaruga de aproximadamente 300 anos.
Agradeço à Mãe Natureza que a longevidade seja um privilégio só seu e não nosso, seu casco duro e sua capacidade de esconder-se dentro dele impediam-na de vislumbrar as atrocidades ali cometidas e seu cérebro minúsculo só lembrava o momento de cada atividade fisiológica, enfim, a perpetuação de sua espécie era seu único dever nesse mundo.
Vá em paz tartaruga, você cumpriu com louvor sua missão nessa terra de Deus.

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